Vinícius Carvalho
O uso da tecnologia blockchain na administração pública brasileira vem se consolidando como uma das estratégias mais promissoras para garantir maior transparência, eficiência e rastreabilidade na prestação de contas dos órgãos governamentais. A implementação de soluções digitais baseadas em registros distribuídos já alcança órgãos como o Banco Central, a Receita Federal, a ANAC, o SERPRO.
O Acórdão nº 1613/2020 do Tribunal de Contas da União apresenta os diversos usos da tecnologia Blockchain na administração pública e considera sua principal vantagem, a de permitir o registro imutável e seguro de informações em uma rede “descentralizada”, para substituir práticas burocráticas e vulneráveis por um ambiente digital baseado em contratos inteligentes e regras de conformidade automatizadas.
No setor público, isso representa uma virada de chave para o controle de gastos, auditorias e combate à corrupção.
Na Receita Federal se destacam soluções como o b-Connect, que serve de base para a troca de dados entre países do Mercosul, e os projetos b-CPF e b-CNPJ, que descentralizam a gestão de informações cadastrais com contratos inteligentes. “ No setor público, isso representa uma virada de chave para o controle de gastos, auditorias e combate à corrupção”
Em Mato Grosso, o município de Rondonópolis saiu na frente com a Lei nº 14.217/2025, que prevê o uso de blockchain no sistema de arrecadação tributária municipal. No plano estadual, o Decreto nº 338/2023 traça metas para adoção da tecnologia até 2027, embora, até o momento, ainda não haja implementações concretas no âmbito do Executivo.
Segundo especialistas, o modelo de “compliance by design” — em que os controles e obrigações legais são codificados diretamente na estrutura da rede — permite que auditores verifiquem os dados de forma automatizada e em tempo real, reduzindo a margem de erro ao estabelecer uma trilha de auditoria previamente acordada em linguagem de programação. Não há retrabalho ou espaço para fraudes.
Essa estrutura também tem potencial de resolver gargalos históricos como falta de comunicação entre os diversos sistemas utilizados pelas instancias de poder federal, estadual e municipais.
A Rede Blockchain Brasil (RBB), fruto de parceria entre o TCU e o BNDES, visa justamente fomentar essa nova lógica gerencial. Hospedada no GitHub e com arquitetura Web3, a RBB é aberta a entes públicos interessados em se conectar como “nós” validadores da rede — promovendo, assim, a descentralização do controle e a colaboração interinstitucional.
Na Baixada Cuiabana, a iniciativa privada, como a startup Minery, em parceria com a plataforma europeia Minespider, oferecem rastreabilidade da cadeia do ouro e apontam para um futuro em que a blockchain viabilizará cadeias produtivas mais sustentáveis, auditáveis e éticas.
O desafio agora é ampliar o entendimento sobre a tecnologia entre gestores públicos, harmonizar a legislação e acelerar a adequação técnica dos entes federados. À medida que mais soluções forem integradas, a blockchain tende a se tornar uma aliada indispensável da legalidade, da eficiência administrativa e do fortalecimento dos direitos fundamentais.
Muito mais que um anseio pessoal de quem foi criança nos anos 90 e vivencia o atraso tecnológico da administração, considero que a blockchain revoluciona pela rastreabilidade e transparência dos atos administrativos, eliminando as barreias entre o cidadão e os valores sociais.
Vinícius Carvalho é servidor público estadual, advogado especialista em Direito Público pela PUC/RS e pesquisador em Governança Digital e Blockchain. @vinni.battista
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